Continuação dos comentários ao Pequeno Ofício de Nossa Senhora
Senhora minha
Desde a
infância, Senhora do Céu e da Terra
Interpretando a
etimologia do santíssimo Nome de Maria, escreve São João Eudes:
“Maria significa Senhora. Efetivamente, a gloriosa Virgem
é, desde a sua infância, Senhora soberana do Céu e da Terra, dos homens, dos
Anjos e de todas as criaturas; e tem um poder absoluto no Céu, na Terra e no
Inferno, sobre os demônios, sobre as coisas corporais e espirituais, e sobre
todas as obras de Deus. E isto por três títulos: como primogênita [das
criaturas] e, portanto, herdeira de todos os estados do Padre Eterno; como Mãe
de Deus, e como Esposa do Espírito Santo que, por conseguinte, participa de
todos os direitos de seu Esposo”18.
Senhora de
toda a criação, no Filho e pelo Filho
Não raras vezes, essa
gloriosa soberania de Maria foi exaltada pela devoção dos Santos e dos autores
eclesiásticos. Em seu bem documentado tratado sobre a Santíssima Virgem, D.
Gregório Alastruey recolhe alguns desses louvores:
“Santo Efrém
dirige-se a Ela dizendo: «Senhora de tudo, depois da Trindade... Virgem
Senhora, Mãe de Deus». [...]
“São Germano de
Constantinopla: «Senhora de todos os filhos da Terra».
“São João Damasceno:
«Em verdade que é propriamente Mãe de Deus e Senhora, e sendo ao mesmo tempo
escrava e Mãe do Criador, impera sobre toda a criação».
“Santo Ildefonso de
Toledo: «O Senhora minha e minha Dominadora, Mãe de meu Senhor, serva de teu
Filho; sois Senhora minha, porque fostes serva de meu Senhor».
“Santo Anselmo: «A
Vós, ó magna e excelentíssima Senhora, quer meu coração amar-Vos!» [...]
“São Boaventura: «A
Bem-aventurada Virgem Maria, como eleita Mãe de Deus, é a Senhora dos Anjos, os
quais A servem como ministros»” 19
A seguir, conclui D.
Alastruey: “Não compete a Maria direito estrito de domínio sobre todas as
coisas criadas; no entanto, na dependência do direito de Cristo, a quem tudo
está submetido, é e pode chamar-se, como Mãe sua amantíssima, Senhora de toda a
criação, no Filho e pelo Filho.
“Ademais, enquanto
sendo Mãe de Deus e consorte do Redentor, conseguiu tanto poder junto do Filho
onipotente, Redentor do gênero humano, para impetrar o que quisesse, que
nenhuma criatura nem autoridade alguma natural se compara em poder com Ela” 20.
Todas as
criaturas aos pés da Virgem
Assim, toma
particular realce este comentário do Pe. Henry Bolo:
“Maria é a Senhora
deste mundo. Ela domina o oceano dos seres, Ela compartilha a soberania de seu
Filho, tendo participado do resgate universal pelo qual foi adquirido esse
império. Ela está revestida do sol, emblema da magnificência do mundo
sobrenatural; Ela tem, sob seus pés, a lua, símbolo desta pálida criação que se
desloca na noite. [...]
“A Igreja, intérprete
do universo, coloca aos pés da Virgem todas as criaturas: para louvá-La, os
campos não têm bastantes flores, nem o céu estrelas, nem as pedras preciosas
brilho, nem as vozes cânticos, nem possuem as almas suficiente pureza. O
triunfo de Maria é excedi do apenas pelo de seu Divino Filho.
“Se não é a Ela que
Deus confere a honra incomunicável e reservada ao Verbo Encarnado, de sentar-se
à sua direita, contudo a Virgem aparece portando o mesmo Deus, como o trono
vivo donde emana a realeza, a justiça, a glória.
“Por isso Ela se
chama Maria: a Soberana” 21.
Senhora do
Senhor dos senhores
“Senhora dos Anjos,
dos homens e das graças!” — exclama outro eminente mariólogo. “Senhora de seu
Filho, que é ser Senhora do Senhor dos senhores.
“Senhora, que
significa dona e dominadora dos Céus e da Terra, à qual estão sujeitas todas as
potestades do Inferno. Dispensadora de todas as graças, e a quem, portanto,
devemos recorrer na vida e na morte, na prosperidade e na adversidade. Ó
Senhora minha!” 22
Estrela da Manhã
“É bem conhecida a
passagem, em geral cheia de poesia, mas também de incertezas, da noite para o
dia.
“Em meio às trevas da
madrugada notam-se, de repente, alguns pontos do céu esbranquiçados, e se tem a
impressão de que é o começo do alvorecer. De fato não o é: o firmamento se
cobre novamente de negro, e só aos poucos vai se tornando pálido. É nesse
momento que brilha, com todo o seu fulgor, a estrela da manhã ou, como muitos a
chamam, estrela d’alva. É ela o anúncio da aurora, o sinal de que o sol está
por vir” 23.
A evocativa beleza
desse corpo celeste refulgindo nos albores do dia, constitui expressiva
representação do esplendor da verdadeira Estrela da Manhã, Maria Santíssima.
Maria e o
símbolo da estrela
“Nossa Senhora —
comenta o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira — é chamada, muito a propósito, de
Estrela luminosíssima. Incontáveis astros reluzem no firmamento, porém Ela é o
mais resplandecente de todos: ou seja, Maria é a mais luminosa das criaturas.
“E por que é
simbolizada pela estrela? Porque é durante a noite que cintilam as estrelas, e
esta vida é para o católico uma noite, um vale de lágrimas, uma época de
provação, de perigo e de apreensões. Na eternidade teremos o dia, porém na vida
terrena temos o escuro da madrugada. E nesta noite existe uma estrela que nos
guia, que é a consolação de quem caminha nas trevas, olhando para o céu: Maria
Santíssima, a mais fulgurante de todas as estrelas!” 24
O Pe. Jourdain nos
indica outras razões pelas quais Nossa Senhora é apresentada pela figura da
estrela:
“O símbolo da estrela
convém admiravelmente a Maria. Ele nos faz melhor compreender suas inefáveis
grandezas e o que para nós Ela representa. «O
sol é Jesus Cristo, e Maria é a estrela», diz Hugo de São Vitor. [...]
“Vários astros tiram
toda a sua luz do sol. Maria testemunha que Ela também tirou sua luz do Sol de
Justiça, Jesus Cristo. «Aquele que é
poderoso, diz Ela, fez em Mim grandes coisas, e seu nome é santo». Ela
reflete tão perfeitamente a luz divina, que a Igreja não hesita em Lhe aplicar
várias passagens da Sagrada Escritura que concernem, em primeiro lugar, à
Sabedoria incriada. [...]
“A estrela permanece
sempre no firmamento, e jamais baixa sobre a terra. A Santíssima Virgem sempre
levou uma vida celeste: todas as suas afeições estavam no Céu. Nunca aplicou
seu espírito nas coisas terrenas e carnais. Assim o Esposo louva sua fronte,
dizendo que «ela é como o monte Carmelo»
(Cânt. VII, 5). Assim como o píncaro do Carmelo nunca se viu coberto pelas nuvens
e gozou sempre de um ar puro, assim a alma de Maria jamais foi molestada pelas
afeições terrestres e nebulosas: resplandecia Ela de celeste serenidade. [...]
“Os antigos viam a
substância das estrelas como incorruptível, inacessível, portanto, à destruição
que o tempo traz para as coisas da Terra. Maria foi isenta de toda corrupção:
sua carne não conheceu a dissolução no túmulo, nem sua alma, a produzida pelo
pecado.
“Uma estrela deita
sua luz com grande fulgor, sem lesão de sua substância. A Bem-aventurada Virgem
Maria, do mesmo modo, sem prejuízo de sua virgindade, projetou de suas castas
entranhas o Cristo, a Luz do mundo. [...]
“As estrelas influem
sobre as criaturas terrenas, iluminando-as e contribuindo à sua geração. Sem a
luz do sol, da lua e das estrelas, o universo cairia numa espécie de caos. A
Bem-aventurada Virgem Maria influi igualmente sobre o mundo obscurecido pelas
trevas do pecado: Ela o ilumina, protege-o e o conserva sob seu domínio, de tal
maneira que, se Ela não existisse, de há muito teria o mundo desaparecido.
[...]
“Uma estrela, apesar
de sua aparente imobilidade, percorre com extrema rapidez e perfeita regularidade
distâncias inimagináveis. Assim, a Virgem Santíssima, apesar de sua firmeza
inabalável, percorreu uma tão vasta trajetória na via da perfeição e dos
méritos, que sobrepujou a todos os Santos e todos os Anjos. [...]
O Divino
Sol de Justiça não eclipsa a beleza de Maria
“Existe, porém, uma
diferença entre Maria e as estrelas. Quando aparece o sol, todos os demais
astros se despojam de seus raios e parecem imergir no nada, O Divino Sol de
Justiça não eclipsa a beleza de Maria. Pelo contrário, confere Ele maior brilho
à sua glória. [...]
“[Podemos resumir
com] Guilherme de Paris: «Maria, desde o
seu nascimento, foi uma estrela, por sua preservação do pecado original que A
tomou incorruptível; pela luz do bom exemplo que Ela espargiu em torno de si e
que se estendeu ao mundo inteiro; por seu desapego das coisas da Terra:
desprezou a glória, porque foi humilde, as riquezas porque foi muito pobre, os
prazeres porque foi santíssima; pelo novo fulgor que Ela confere ao Paraíso, do
qual sua glória é um dos mais belos ornamentos». [...]
Em importante
conjuntura de sua admirável gesta contra-revolucionária, o Prof. Plinio Corrêa
de Oliveira assim se dirigiu aos seus seguidores:
“A estrela da manhã
aparece no período incerto entre a noite que ainda existe, e o dia que
timidamente vai nascendo.
“Não é bem essa a
época em que vivemos, na qual imperam as trevas da Revolução, porém na qual já
se pressente o triunfo do Sapiencial e Imaculado Coração de Maria, prometido
por Nossa Senhora em Fátima?
“Portanto, é a Maria
enquanto Stella Matutina, enquanto a Estrela que nos anuncia como iminente a
aurora de seu Reino, é a Ela que devemos recorrer nas dificuldades referentes à
causa contra-revolucionária, em nosso apostolado, e em todas as ocasiões em que
a piedade nos sugira essa invocação.
“Estrela da Manhã,
Vós que fostes, durante a noite inteira da espera, a nossa luz e a promessa do
alvorecer, fazei com que desponte quanto antes o dia de vosso Reino!”
CORREA DE OLIVEIRA,
Plinio. Conferências em 28-29/11/1991 e 1/12/1991. (Arquivo pessoal).
Estrela da
Manhã que precedeu o Sol de Justiça
“A augusta Virgem
Maria — prossegue o Pe. Jourdain — é a mais resplandecente das estrelas que
cintilam na abóbada celeste: Ela é a estrela da manhã, de todas a mais bela e a
mais brilhante. [...J
“A estrela da manhã
marca o fim da noite precedente e o começo do dia. Maria foi igualmente o fim
da noite, e o começo de um novo dia. Antes do nascimento de Maria, as trevas do
pecado e a noite da infidelidade mantinham o universo sob tão cruel opressão,
que não podia ele divisar o Sol de Justiça, o Cristo, o Messias prometido. Deus
Se fez preceder, portanto, pela Estrela da Manhã, a fim de que os olhos do
coração [humano], obcecados pelo lodo imundo das iniquidades e, em
consequência, incapazes de fitar a grande e verdadeira luz, se habituassem
primeiro à claridade da Estrela, para em seguida e gradualmente receber [...] o
brilho de Jesus Cristo.
“Eis porque a
graciosa Virgem Maria surge toda resplandecente, antes do nascer do verdadeiro
Sol; eis porque nossa Estrela da Manhã precede o Salvador. Desde o aparecimento
desta Estrela cintilante de claridade, dissipou-se a sinistra escuridão do crime
e do erro, o culto dos ídolos foi abalado, e os oráculos dos falsos deuses
reduzidos ao silêncio.
“A estrela da manhã,
precedendo o sol, o traz consigo. A Bem-aventurada Virgem Maria introduziu
entre nós o verdadeiro Sol de Justiça, que ilumina todo homem vindo a este
mundo. Ela pode, portanto, ser chamada fonte de luz. É esta a saudação que Lhe
dirige São Gregório o Taumaturgo: «Eu Vos
saúdo, cheia de graça, fonte de luz, que ilumina todos os que creem em Vós!»
“E São Metódio
igualmente Lhe diz: «Ao primeiro clarão,
ó Santíssima Virgem, desta fulgurante luz que trouxe ao mundo o verdadeiro Sol
de Justiça, desapareceu o espantoso horror das trevas, e o universo inteiro se
encheu dos mais puros fulgores da verdade!»
Estrela que
afugenta os demônios e embeleza a criação
“A estrela da manhã
anuncia a chegada do sol, o que obriga às serpentes, aos lobos, às feras e aos
animais selvagens a entrar novamente em suas tocas; ela espanta as aves
noturnas e convida os pássaros do céu a entoarem seus cantos. A Bem-aventurada
Virgem Maria não foi apenas a mensageira do Sol de Justiça. Ela O trouxe em seu
seio; Ela pôs em fuga as bestas infernais, isto é, os demônios; Ela dissipou,
como aves da noite, os fátuos erros do paganismo; e Ela incitou aos próprios
Anjos e a todas as almas santas a celebrar os louvores do Senhor. [...]
“A estrela da manhã
amedronta os ladrões, fortifica os doentes, a tudo embeleza. Maria afugentou os
ladrões que são os demônios. Desde que Ela deu ao mundo o Filho de Deus feito
homem, Satanás compreendeu que ele estava destituído de seu usurpado império.
Júpiter, Marte, Vênus, Saturno e as outras monstruosas divindades adoradas
pelos homens, eclipsaram-se vergonhosamente. [...]
“Maria, como a
estrela da manhã, reanima os enfermos, quer dizer, os pecadores, pois Ela
engendrou o Sol do qual foi dito pelo Profeta Malaquias (IV, 2): «0 sol da
justiça se levantará para vós que temeis meu nome, e encontrareis vossa
salvação sob suas asas». Ademais, por sua intercessão, Ela afugenta as
tentações da concupiscência e os maus pensamentos, e sana todas as enfermidades
fortificando os doentes.
“Maria a tudo
embeleza. Com efeito, desde que, após tantos séculos de trevas, Ela se mostrou
ao mundo, e com Ela seu Divino Filho, sua beleza, sua bondade, sua humildade,
seu amor, sua demência, sua misericórdia, sua benevolência, espargiram um tão
vivo fulgor, que o mundo pareceu mais belo aos olhos de Deus e dos Anjos, como
não era antes da queda do primeiro homem, e a Terra mesma estremeceu de júbilo.
[...1
Fulgurante
astro no firmamento da santidade
“Entre todos os
astros da noite, a estrela da manhã é aquele que cintila mais vivamente. A
Bem-aventurada Virgem Maria elevou- se acima dos Santos do Antigo Testamento.
Ela reluz no meio deles com incomparável brilho. Seus raios se obscurecem ao
aparecimento de Maria, porque suas virtudes, comparadas às d’Ela, perdem todo o
fulgor.
“Que são, em presença
das perfeições de Maria, a inocência de Abel, a justiça de Noé, a obediência de
Abraão, a paciência de Jacob, a castidade de José, a doçura de Moisés, a
coragem de Josué, a caridade de Samuel, a humildade de David, o zelo de Elias,
a abstinência de Daniel, a eminente santidade de São João Batista, a candura de
Simeão, a piedade de Ana, a santidade de Isabel? Assim como em comparação com
Deus ninguém é santo, de igual modo ninguém, posto em paralelo com Maria, é
perfeito, puro e ornado de extraordinárias virtudes.
“Tal é o sentimento
de São Jerônimo, que, após enumerar várias santas mulheres do Antigo
Testamento, acrescenta: «Silencio-me
sobre Ana, Isabel e as outras mulheres. Fraco é o seu brilho, empalidecendo e
se eclipsando em presença da exuberante luz de Maria». Bem merece Ela,
pois, o nome de Estrela da Manhã.
“Ao despontar da
estrela d’alva, cai o orvalho a refrescar os campos e a fecundar a terra. Ao
aparecimento da Mãe de Deus, difundiu-se um abundante rocio de graça sobre o
mundo: o Verbo de Deus desceu ao seu seio para nele se revestir de nossa
natureza humana.
“Enfim, não se passa
das trevas da noite à luz do dia, sem que a estrela da manhã tenha espargido
sua doce claridade. Do mesmo modo, é impossível passar das trevas do pecado à
luz da graça e das virtudes, sem a intercessão de Maria” 25.
18)
EUDES, Juan. La Infancia Admirabile dela Santísima Madre de Dios. Bogotá: San
Juan Eudes, 1957. p. 295-296.
19) ALASTRUEY, Gregório. Tratado
dela Vuìgen Santísima. 3. ed. Madrid: BAC, 1952. p. 823.
20) Idem, p. 827.
21) BOLO, Henry. Pleine de Grace. Paris:
René Haton, 1895. p. 55-56.
22)
BARCON, Javier. Aprende a orar. Apud ROYO MARIN, Antonio. La Virgen María,
Teología y espiritualidad marianas. Madrid:
BAC, 1968. p. 446.
23) Cfr. CORREA DE OLIVEIRA,
Plinio. Conferências em 29/11/1991 e 1/12/1991. (Arquivo pessoal).
24) Cfr. CORRÊA DE OLIVEIRA,
Plinio. Conferência em 24/8/965. (Arquivo pessoal).
25) JOURDAJN, Z.-C. Somme des Grandeurs de Marie.
Paris: Hippolyte Walzer, 1900. Vol. III. p. 272-282; Vol. V p. 605.
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