Hora Tercia
Conforme
observa São João Eudes, “todos os livros sagrados da Lei de Moisés estão cheios
de figuras e símbolos das digníssimas Pessoas de Nosso Senhor Jesus Cristo e de
sua sacratíssima Mãe. E todos os Santos Padres, em seus escritos, se comprazem
em nos descobrir tais figuras, e em nos fazer ver seu esplendor e beleza” .
O
terceiro Hino do Pequeno Ofício evoca alguns desses símbolos sugeridos pelo
Espírito Santo, nas páginas do Antigo Testamento, para fazer conhecer e amar
pelos homens a futura Mãe de Deus, antes mesmo que Ela aparecesse sobre a
Terra.
Assim,
entre outras, foram imagens de Nossa Senhora: a Arca da Aliança, que continha
as tábuas da Lei; o magnifico trono de Salomão; o arco-íris traçado no céu,
após o castigo do dilúvio; a vara de Aarão, que floresceu dentro da Arca do
Testamento; o velo de Gedeão, ora seco, enquanto toda a terra ao seu redor
estava molhada de orvalho; ora embebido de rocio, quando aquela permanecia
árida; a sarça ardente, de dentro da qual Deus falou a Moisés; o favo de mel
que Sansão encontrou no cadáver do leão morto por ele; e a porta oriental do
templo, que Ezequiel discerniu, cerrada, em uma de suas proféticas visões.
A
recordação desses símbolos da Santíssima Virgem, acompanhada de novos e
expressivos louvores à sua Imaculada Conceição, compõe a bela Hora mariana que
a seguir contemplaremos.
Sois a Arca da Aliança, o
trono de Salomão
Em
meio à “glória do Senhor” que abrasava o alto do Monte Sinai, Moisés recebeu de
Deus esta ordem (Ex. XXV, 10-16): “Fazei uma Arca de pau de setim, cujo
comprimento tenha dois côvados e meio, a largura côvado e meio, e altura
igualmente côvado e meio. Revesti-la-ás de ouro puríssimo por dentro e por
fora; e farás sobre ela uma coroa de ouro em roda; e farás quatro argolas de
ouro, que porás nos quatro cantos da Arca: duas argolas de um lado, e duas do
outro. Farás também varais de pau de setim e os cobrirás de ouro, e os farás
passar por dentro das argolas que estão aos lados da Arca, a fim de que sirvam
para o transporte. Estarão sempre metidos nas argolas, e nunca se tirarão
delas. E porás na Arca o Testemunho que Eu te hei de dar.”
Símbolo das
múltiplas dignidades de Nossa Senhora
No
seu precioso conjunto, essa Arca constituía eloquente imagem da futura Mãe do
Verbo Encarnado. Tal relação foi assim estabelecida por São Boaventura, em um
de seus admiráveis discursos mariológicos:
“Segundo
a exposição dos Santos, a Arca, no sentido alegórico, refere-se a Cristo e à
Igreja; [...j no místico, representa a Virgem gloriosa, Santa Maria,
felicíssima Mãe de Deus e Senhora nossa. [...]
“Sob
a figura da Arca do Testamento, insinua-se a múltipla dignidade da Virgem
segundo os diversos aspectos que a Escritura nos ensina a considerar naquela
mística Arca.
“Com
efeito, a Escritura nos propõe a consideração desta Arca sob quatro aspectos, a
saber: segundo o que ela é (construção), segundo o que há nela (conteúdo),
segundo o que dela procede (eficácia), e segundo o que a ela se refere (honra).
Maria, Arca do
Testamento, quanto à sua construção
“Aquela
Arca, como diz a Sagrada Escritura, foi construída de matéria incorruptível, de
proporções adequadas, de bela forma e de figura quadrangular, no que se indica
a dignidade da gloriosa Virgem, fabricada segundo a arte do Filho de Deus e do
Espírito Santo.
Virgindade
incorruptível
“Maria
é Arca do Testamento quanto à sua construção, primeiro, por ser de matéria
incorruptível, devido à integridade de seu corpo. [...] Integridade que A
livrou do peso da carne e A tornou incorruptível, separando-A do contágio da
corrupção, que dimana dessa mesma carne.
Virtudes
proporcionadas
“Segundo,
a Virgem foi Arca do Testamento, quanto à sua construção, porque foi de medidas
proporcionadas, devido à humildade de coração, segundo o capítulo XXXVII do
Exodo: «E Beseleel fez a Arca de pau de
setim, a qual tinha dois côvados e meio de comprido, côvado e meio de largo, e
também côvado e meio de alto». Por côvado inteiro da medida completa se
entende a virtude perfeita na realização dos atos; por metade se entende a
humildade perfeita na consideração dos defeitos; [...] e essas duas coisas
teve, de modo eminentíssimo, a Virgem Maria, pois possuiu, ao mesmo tempo, uma
virtude perfeita e uma profunda humildade.
Beleza de formas,
fruto da honestidade de vida
“Terceiro,
a Virgem foi Arca do Testamento, quanto à sua construção, porque foi bela na
sua forma, devido à honestidade de sua vida, segundo as palavras do capítulo
XXXVII do Exodo: «E revestiu-a de ouro
finíssimo por dentro e por fora. E fez-lhe uma cornija de ouro ao redor».
Por este revestimento de ouro se entende a plenitude da suma honestidade, que
adornou por dentro e por fora à Virgem Maria. [...] E adverte que se disse
tinha ao redor uma cornija de ouro, pela honestidade que brilhou em todos os
seus atos.
Exímia observante
da Lei divina, segundo as virtudes cardeais
“Quarto,
a Virgem foi Arca do Testamento, quanto à sua construção, por ser de forma
quadrangular, devido à igualdade de quatro maneiras de virtude, segundo as
palavras do capítulo XXV do Exodo: «E
farás quatro argolas de ouro, que porás nos quatro cantos da Arca. Farás também
varais de pau de setim e os cobrirás de ouro, e os farás passar por dentro das
argolas que estão aos lados da Arca, a fim de que sirvam para o transporte».
“Pelos
quatro cantos se entendem as quatro virtudes cardeais; pelas argolas nos quatro
cantos, a obediência quadriforme dos preceitos divinos segundo a exigência das
quatro virtudes. Pelos varais se entendem duas coisas: o temor e o amor, que
nos levam pelo caminho dos bons costumes.
“A
Virgem gloriosa possuiu tudo isto na perfeição, pois observou eximiamente a
divina Lei, submetendo-se a esta segundo as quatro virtudes cardeais, a saber:
prudência, justiça, temperança e fortaleza, que, embora distintas, têm conexão
e igualdade entre si, e se conduzem pelo temor e amor perfeito, e por elas a
Arca chegou até o Céu. E adverte como disse que os varais estarão sempre
metidos nas argolas, e nunca se tirarão delas, porque o temor e o amor sempre
devem estar unidos com as virtudes cardeais para o cumprimento dos mandamentos divinos;
e assim o estiveram na gloriosa Virgem.
Maria, Arca do
Testamento, quanto ao seu conteúdo
“No
interior daquela Arca material — prossegue São Boaventura — guardava-se o maná,
a vara [de Aarão] e duas tábuas da Lei; e, por cima, como remate, estavam dois
Querubins fazendo sombra ao propiciatório. Por esse conteúdo, significa-se
adequadamente quanto a Virgem teve em seu interior. A Bem-aventurada Maria, com
efeito, foi Arca que continha por dentro: o maná, pela doçura da graça; a vara,
pela virtude da confiança; a Lei, pela reta inteligência. Tinha, ademais, por
cima, dois Querubins, pela plenitude da sabedoria. [...J
A doçura da graça
(maná)
“Em
primeiro lugar, [...] quando foi construída e nasceu essa Arca, então foi
cumulada com a doçura da graça, não só para sua pessoa, senão também para todas
as gerações sucessivas. [...]
A virtude da
confiança (vara)
“Em
segundo lugar, foi também Arca que continha a vara de Aarão, que floresceu,
pela virtude da confiança. [...1 Virtude que tornou apto o rebento do tronco de
Jessé para, sem obra de varão, produzir a flor de Nazaré, pela promessa de Deus
e a sombra do Espírito Santo, a quem a Virgem Maria se uniu estreita e
confiadamente. [...)
A reta
inteligência (Lei)
“Em
terceiro lugar, foi Arca da Aliança que continha as tábuas da Lei, pela reta
inteligência, segundo as palavras do capítulo XXV do Exodo: «E porás na Arca o
Testemunho que Eu te hei de dar».
“Esta
Lei foi escrita e colocada na Arca do Testamento, ou sei a, no coração da
Bem-aventurada Virgem. Assim o atesta São Lucas, no capítulo II de seu
Evangelho: «Entretanto Maria conservava todas estas coisas, meditando-as no seu
coração». Como a Arca do Testamento conservava a Lei de Moisés, assim Ela
guardava a Lei do Evangelho pela reta inteligência da verdade da fé e de toda a
Lei de Cristo. [...]
A plenitude da
sabedoria (Querubins)
“Em
quarto lugar, foi Arca do Testamento porque continha os Querubins, pela
plenitude da sabedoria. [...] A Virgem encerrava em si os recônditos mistérios
da sabedoria divina, por ter trazido em seu seio a carne de Cristo, em quem
estão contidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência.
Maria, Arca do
Testamento, quanto à sua eficácia
“Depois
do dito, consideremos a eficácia da Arca, na qual se representava a Virgem
Maria, no tocante ao que dela procede.
Eficaz no
conduzir os homens ao Céu
“Com
efeito, aquela Arca, símbolo de Maria, foi eficaz para dirigir os caminhantes,
segundo aquilo do capítulo X dos Números: «Partiram, pois, do monte do Senhoi e
caminharam três dias, e a Arca da Aliança do Senhor ia adiante deles,
indicando-lhes nos três dias o lugar para os acampamentos».
“Por
esses três dias se entende toda a vida presente, quanto ao seu começo, decurso
e fim, ou os três votos que conduzem o homem ao deserto da Religião, como por
um caminho de três dias, a saber: da continência, pobreza e obediência, graças
à ajuda da Virgem Maria, que foi pobríssima, humílima e castíssima. Ela vai
adiante e prepara o caminho até introduzir na Terra de Promissão, como se diz
no capítulo III de Josué: «Eis que a Arca da Aliança do Senhor de toda a Terra
irá adiante de vós pelo meio do Jordão»; e continua mais abaixo o texto dizendo
que, à entrada da Arca [no rio], secar-se-ão as águas, significando-se nisto
que com o auxílio da Virgem se torna fácil o que antes parecia difícil.
Eficaz em
socorrer os homens nos seus perigos e angústias
“Em
segundo lugar, a Arca, figura da Virgem, foi eficaz para defender os que
combatiam, segundo se diz no capítulo VI do livro segundo dos Paralipómenos:
«Levanta-te, ó Senhor Deus! e vem ao lugar fixo de tua morada, Tu e a Arca de
teu poderio».
“Diz-se
de teu poderio, porque é forte para defender, conforme cantamos: «Dai-me poder
contra teus inimigos». Para significar isto, dizem os anciãos de Israel no
capítulo IV do primeiro livro dos Reis: «Façamos vir para nós de Silo a Arca da
Aliança do Senhor e venha para o meio de nós, para que nos salve da mão de
nossos inimigos», porque ela pode realmente salvar.
“Contudo,
acrescenta-se ali que não salvou a todos, sendo a razão disto o estarem eles
manchados pela idolatria, desprezando, portanto, em seu interior o que
veneravam exteriormente. Pelo que, diz São Bernardo: «Nos perigos, nas
angústias, pensa em Maria, invoca a Maria; e para conseguir a ajuda de sua
intercessão, não deixes de seguir o exemplo de sua conduta». Porque quem invoca
com os lábios e contradiz com suas obras, não merece ser ouvido nem salvo, mas
antes receber sentença de condenação.
Eficaz no
reconciliar os pecadores arrependidos com Deus
“Em
terceiro lugar, a Arca era eficaz para reconciliar os arrependidos, segundo se
diz no capítulo XXVI do Êxodo: «Porás também o propiciatório sobre a Arca do
Testemunho do Santo dos Santos».
“Que
é o propiciatório, senão aquele por quem se alcança a remissão dos pecados?
Assim se diz no capítulo II da primeira carta de São João: «Temos por advogado,
junto ao Pai, Jesus Cristo, justo. Ele é a propiciação pelos nossos pecados»,
etc.; e este propiciatório se acha colocado sobre a Arca, porque chegamos a ele
por meio da Virgem Maria, que, como Mãe de misericórdia, roga ao Filho por nós
e aplaca a Deus, irado por nossos pecados.
Eficaz no
derrotar os inimigos de nossa salvação
“Em
quarto lugar, a Arca foi eficaz para derrotar os rebeldes, como se diz no
capítulo X dos Números: «E, quando se levantava a Arca, Moisés dizia:
Levanta-te, Senhor e sejam dispersos os teus inimigos», por isso, referindo-nos
à Virgem, cantamos o verso: «Alegra-te, ó Virgem Maria!», etc. Ela é, com efeito,
a mulher que esmagou a cabeça da serpente; é, do mesmo modo, a Arca que feriu
de morte os filisteus, como se descreve no capítulo V do livro primeiro dos
Reis: «E levando eles [a Arca] de cidade em cidade, a mão do Senhor fazia
grande mortandade em cada cidade». Em figura disto se diz no capítulo VI do
livro de Josué que, dando voltas a Arca do Senhor ao redor de Jericó, caíram os
muros desta cidade, porque Ela é quem derrota a seus inimigos e aos de Cristo,
como Ester a Aman, e como Judith a Holofernes, e Jahel a Sísara, pois Ela é tão
terrível a nossos inimigos como um exército em ordem de batalha.
Maria, Arca do
Testamento, quanto à honra que lhe é devida
• Honrada com unânime obséquio
“Por
fim, devemos considerar a Arca quanto à honra que se lhe dava, para deduzir
disto a honra e reverência que se há de tributar à gloriosa Virgem.
“Ela,
figurada na Arca, há de ser honrada com unânime obséquio, como se simboliza no
capítulo VIII do livro terceiro dos Reis: «Então todos os anciãos de Israel com
os príncipes das tribos, e os chefes das famílias dos filhos de Israe4
reuniram-se junto do Rei Salomão em Jerusalém, para transladar a Arca da
Aliança do Senhor da cidade de David»; nisto se entende que tanto grandes
quanto pequenos devem se unir para honrar e reverenciar unanimemente à gloriosa
Virgem. [...]
Honrada com humilde obséquio
“Em
segundo lugar, há de ser honrada com obséquio humilde, como se descreve no
capítulo VI do segundo livro dos Reis: «David estava cingido de um efod de
linho. E David e toda a casa de Israel conduziam a Arca do Testamento do Senhor
com júbilo e ao som de trombetas». David, que honrava humildemente a Arca,
simbolizava a Cristo, que venera humildemente a sua Mãe, a Virgem gloriosa. Do
mesmo modo que, a exemplo do Rei, humilhado, humilhavam-se com gosto os demais
para glorificar a Arca, assim a exemplo do verdadeiro David, Cristo, que se
humilhou para render honra a esta Arca [Maria] — pois pelo capítulo II de São
Lucas consta que estava sujeito à Mãe —, devem os cristãos humilhar-se e render-Lhe
tributo de honra. Por que como Ela é a mestra da humildade, quanto mais alguém
se humilha a seus pés, tanto maior honra Lhe tributa.
Honrada com solene obséquio
“Em
terceiro lugar, há de ser honrada com obséquio solene, como se diz no capítulo
VI do livro segundo dos Reis: «Foi pois David, e levou a Arca de Deus da casa
de Obededom; e David levava consigo sete coros de músicos». Por estes sete
coros, reunidos para tributar homenagem à Arca, simboliza-se a comunidade de
todos os fiéis, que devem proceder distinta e não confusamente, isto é, com
ordem, ao cantar os divinos louvores. E porque estes devem ser cantados com
toda a alma, acrescenta-se que David tocava os instrumentos de música e
«dançava diante do Senhor com todas as suas forças». [...]
Honrada com infatigável obséquio
“Em
quarto lugar — conclui São Boaventura —, a Arca há de ser honrada com
infatigável obséquio, como se diz no capítulo III do livro primeiro dos Reis:
«Samuel dormia no templo do Senhor onde estava a Arca de Deus», porque atendia
sem descanso ao cuidado da Arca, cumprindo o que diz o Evangelho: «O que
perseverar até o fim, este será salvo»”.
Penhor da
proteção divina
Fazendo
eco ao luminoso ensinamento do Doutor Seráfico, escreve o Pc. Jourdain:
“Maria
é nossa Arca da Aliança. Quando A elevamos e A conduzimos diante de nós,
seguindo as sendas da vida, Deus está conosco, e podemos dizer com Moisés:
«Levanta-te, Senho,ç e sejam dispersos os teus inimigos, e fujam da tua face os
que te aborrecem». Elevemos, portanto, Maria Santíssima, glorificando-A;
conduzamo-La diante de nós, rogando a Ela sem cessar, imitando suas virtudes, e
caminhemos, com confiança, sob sua poderosa proteção. O próprio Deus construiu
a nova Arca da Aliança e se dignou n’Ela habitar. Ele exaltou sua obra de
predileção sobre todas as criaturas, desde a sua Imaculada Conceição. E ainda
mais alto a ergueu, quando se encarnou em seu seio, tornando-se seu Filho, sem
nada subtrair ao brilho de sua virgindade.
“Essa
Arca santa é, pois, para nós, a fonte de inumeráveis bens. Em meio aos perigos,
Ela é nosso socorro, nossa luz, nosso conselho [...] e nossa consolação. Ela
nos separa do mundo para nos unir a Deus, como a Arca separava as águas do
Jordão: as águas inferiores, o amor do mundo, correm; elevam-se as águas
superiores, o amor de Deus” .
Arca que deteve
as vagas do pecado original
No
mesmo milagre operado pela Arca, ao entrar no Rio Jordão, vê São Francisco de
Sales um simbolismo da Conceição Imaculada de Maria:
“Assim
como as águas do Jordão pararam ao entrar nelas a Arca, e deixaram passar de pé
enxuto os israelitas, a fim de penetrarem na Terra Prometida, assim também as
águas do pecado original suspenderam o seu curso em sinal de reverência,
respeitando, em Maria, o Tabernáculo da Eterna Aliança” .
Arca em cujo
Imaculado Coração está escrita a Lei Divina
Livre,
pois, de todo e qualquer laivo de pecado, a nova Arca do Testemunho se tornou
resplandecente escrínio de santidade. Por isso comenta o Prof. Plinio Corrêa de
Oliveira: “A Lei divina, muito mais do que nas tábuas de Moisés, guardadas na
Arca da Aliança, está escrita na alma de Nossa Senhora. E a partir de seu
Imaculado Coração que a Lei de Deus se irradia para a humanidade inteira, pelo
ministério da Santa Igreja Católica” .
Fonte de graça
para os filhos, princípio de morte para os inimigos
Encerramos
essas considerações sobre Nossa Senhora, Arca da Aliança, com as palavras do
Pe. Rolland, Missionário Apostólico dos primórdios deste século, referindo-se
àquela prefigura da Virgem:
“Que
formoso símbolo de Maria, toda enriquecida do ouro das mais belas virtudes, e
em quem os sete dons do Espfrito Santo brilharam com tão vivo fulgor! De Maria,
em quem a divindade se escondeu, em quem repousou o Pão vivo, e que foi o
santuário do divino alimento de nossas almas, do supremo Rei, do supremo
Sacerdote, do supremo Legislador. De Maria, a Mãe de Deus, a Mãe das
misericórdias, por meio de quem a alma se liberta do cativeiro do demônio,
atravessa o Jordão, derruba as muralhas de Jericó e conquista os mais belos triunfos!
De Maria, fonte de graças para seus fiéis súditos, mas princípio de morte para
os que A insultam!”
O trono de
Salomão
O
livro terceiro dos Reis, descrevendo as glórias e riquezas de Salomão, filho de
David, assim nos apresenta seu magnífico sólio o Rei Salomão um grande trono de
marfim, e guarneceu-o de ouro muito amarelo, o qual tinha seis degraus; e o
alto do trono era redondo pelo espaldar; e dois braços, um dum lado, e outro
doutro, sustinham o assento: e havia dois leões junto de cada braço. E doze
leõezinhos postos sobre os seis degraus, duma parte e doutra; não se fez obra
semelhante em nenhum outro reino (do mundo).”
Entretanto,
mais do que por seu esplendor material, valia esse régio assento pelo fato de
simbolizar Aquela que seria o riquíssimo trono do verdadeiro Salomão, Nosso
Senhor Jesus Cristo.
Obra-prima
destinada ao Divino Salomão
Percorramos
algumas das belas páginas da Mariologia que focalizam Nossa Senhora enquanto
representada pelo trono do Rei Sábio. Escreve o Pe. Jourdain:
“Entre
as figuras que Deus multiplicou no Antigo Testamento para simbolizar Maria e
nos proporcionar uma ideia de suas sublimes perfeições, cumpre assinalar o
trono de Salomão, esse grande trono de marfim revestido de puríssimo ouro, esse
trono maravilhoso do qual o Espírito Santo afirma que não foi feita semelhante
obra em reino algum. Esse trono de marfim e de ouro era a obra-prima destinada
ao Rei Salomão: quem o poderá comparar ao trono que Deus preparou para si
mesmo, a Bem-aventurada Virgem Maria?
“Quão
preciosa é a matéria desse trono! A carne de Maria devia fornecer os primeiros
elementos do adorável corpo de Jesus; e sua alma havia de ser ainda mais pura
do que esta carne virginal. E com que arte o Criador de todas as coisas, Aquele
cujas menores obras excedem todas as concepções do gênio humano, com que arte,
digo, não trabalhou Ele esta matéria perto da qual o ouro e o marfim são menos
que o pó?
“O
Pai trabalhava pela honra de seu Filho, o Filho trabalhava por -sua Mãe, o
Espírito Santo trabalhava por sua celeste Esposa. Ó trono do Divino Salomão,
como sois belo, como sois perfeito! [...]
Trono revestido
das mais belas virtudes
“Esse
trono é grande pela própria humildade de Maria, cuja baixeza foi objeto da
observação do Senhor, para elevá-La acima de todas as criaturas. É grande
porque Maria possui, a um grau incomparável, todos os dons naturais e
sobrenaturais que Deus distribuiu, com medida, entre as demais obras saídas de
sua adorável mão.
“Esse
trono é de marfim, pois Maria é a Virgem das virgens. Ele está inteiramente
recoberto do mais puro ouro, porque Deus concedeu a Maria a mais ardente e mais
perfeita caridade, superior à dos próprios Querubins e Serafins.
“O
trono de Salomão contava seis degraus. A humildade de Maria, sua virgindade,
seu espírito de pobreza, seu pudor, sua paciência e sua temperança foram os
seis degraus desse místico trono.
“A
parte superior do trono era redonda, o que faz lembrar a esperança das coisas
celestes. Os dois braços que sustentavam o trono representam o respeito e o
temor. Maria, com efeito, temia e respeita va seu Filho: Ela via n’Ele seu
Senhor e seu Deus.
“Havia
dois leões junto aos dois braços, e doze leõezinhos sobre os seis degraus. As
virtudes de Maria estavam bem guardadas, e os mais poderosos dos Anjos do
Senhor velavam junto d’Ela para rechaçar o inimigo de todo o bem.
Trono espiritual
do verdadeiro Salomão
“Jesus
encontra seu repouso na virgindade de Maria, porque Ele ama a pureza. Ele
repousa sobre sua caridade, pois ama a concórdia entre os irmãos. Ele repousa
sobre sua humildade, porque Lhe agrada a alma tranquila. Maria é seu trono bem
favorito, o lugar de sua paz e de suas delícias” .
Esse
aspecto de Nossa Senhora enquanto trono espiritual do Filho de Deus nos é
apresentado também por outros ardorosos encomiastas da Santíssima Virgem. Para
Fr. Luís de Granada, Ela “é figurada pelo formosíssimo trono de Salomão, do
qual diz a Escritura que era feito de marfim, e estava revestido de um ouro
muito resplandecente, e que obra como aquela não fora nunca realizada em todos
os reinos do mundo (III Reis, X, 20). As quais coisas, todas perfeitissimamente
convêm a esta sacratíssima Virgem, como a trono espiritual d’Aquele verdadeiro
Salomão, pacificador do Céu e da Terra” .
Por
sua vez, São Tomás de Villanueva assim comenta:
“O
trono de Salomão era de marfim e ouro finíssimo, com seis degraus e dois
braços. A Virgem é o trono de nosso pacífico Salomão, de Nosso Senhor Jesus
Cristo segundo a carne; a Virgem, digo, que Ele formou de marfim e ouro
finíssimo e limpíssimo, porque a criou puríssima e imaculada.
“Os
seis degraus são as virtudes de todas as hierarquias eclesiásticas que teve em
si, isto é, patriarcas, profetas, apóstolos, evangelistas, mártires,
confessores, virgens, anacoretas. E os dois braços, a criação e a preservação
do pecado. Escultura maravilhosa e admirável obra do Excelso”.
E
São Pedro Damião diz que o “Nosso Salomão, não somente o mais sábio dos Reis,
mas a própria sabedoria do Pai, não apenas o Rei Pacífico, mas nossa paz, [...]
preparou para si um trono, o seio da puríssima Virgem. Sobre esse trono repousa
a Majestade que, com um sinal, abala a Terra. [...]
“A
substância do marfim merecia ser empregada nessa obra maravilhosa e sem rival.
O marfim, com efeito, resplandece de admirável brancura; ele é sólido e
resistente; ele é frio, de seu natural. Existe alvura mais fulgurante que a
virgindade de Maria, que atrai todos os olhares da admiração da corte celeste?
Há força maior do que aquela de que se serviu a própria força de Deus, para
arrebatar ao demônio suas armas?
Existe
substância mais estranha a todo fogo impuro, do que a substância sombreada pela
virtude do Altíssimo, e defendida contra todo pecado pela plenitude do Espírito
Santo que desceu sobre ela?”
Trono de Deus
para os pecadores
Magnífico
trono do Rei dos reis, “Maria é também um trono de Deus para os pobres
pecadores. São Paulo escrevendo aos hebreus nos convida a nos aproximarmos
d’Ela: «Aproximemo-nos com confiança, diz ele, do trono da graça».
“Aqueles
que pecaram, arrastados por maus desejos, encontrarão misericórdia ao se
aproximarem desse trono. Aqueles que pecaram por ignorância e cegueira, obterão
a graça de Deus, segundo a oportunidade do momento: Utgratiam inveniamus in
tempore oportuno.
“Maria
será o trono de Deus no dia do juízo; trono do qual partirá o raio para
espantar os miseráveis, e que brilhará como o sol, para alegrar os bons”.
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